Luana Mockffa é cantora
brasilis. Luana vive em Floripa. Luana é musa do dream pop. Luana transita em
um país afogado na mediocridade dos homens de gravata. Luana acaba de lançar um
single que está causando e prepara novidades. Luana bateu um papo com Jogos da Memória sobre seu processo
criativo, seus singles, e de como é viver em um
pedacinho de terra perdido no mar...
Como é ser artista no
nosso convívio ?
Minha família nunca me
levou a sério, inclusive na música. Nunca foram nos meus shows, nunca deram
bola para ouvir minhas músicas, os vídeos, nada. Mas desta vez eles pararam...acho
que foi o vídeo do Vernizzi, e da música ser mais pop, eles levaram a sério...
do tipo “uau, nem parece que foi você que fez”. E a partir disso meu pai tem me
dado alguma sugestão de apoio no sentido financeiro...ou seja, toda uma
logística que envolve uma certa grana, e tá sendo positivo isso.
Mas já tinha lançado o
primeiro EP ?
Sim, mas o primeiro EP
foi bem atrapalhado, eu tinha 24 pra 25 anos. Foi em 2013 que começamos a
gravar e lançado em 2014. Tinha cinco faixas, sendo que em duas delas eu não
fiquei satisfeita, mas vou relançar. Chamava-se Algia, que é um sufixo de
dor....como fibromialgia.... A música já transitava pelo Dream Pop. Tem uma
versão de Manhã de Carnaval, uma bossa nova do Luiz Bonfá, de 1953...por aí.
Mas no EP não faz alusão alguma a bossa nova, é um arranjo de milonga, com uma
distorção à la Bang Bang, da Nancy Sinatra. E isso dentro do meu mundo não
precisa de significado, ou que referencie um rótulo para minha música...preciso
é que se materialize. É uma música de sintetizadores, mas a guitarra é
guitarra. Tem clarinete, no timbre, e funciona muito bem. Na época, eu tava
numa pira de entoações tribais, de cantos meio xamânicos, então tem umas
segundas vozes que lembram isso. Tem outra faixa que se chama Mount of Sugar,
que eu me inspirei na obra Revolução dos Bixos. Na versão em inglês tem uma
fábula que os bixos contam para os outros bixos, que tem um lugar que se chama
mount of sugar. Lembro que eu relacionei a morte, mas uma boa morte...na época
eu tava tão niilista que eu pensei, bom, esse lugar não existe...
O EP tem uma mensagem
ou algo que o identifica com esse momento?
Tem algo central, que é
o processo de dor que eu estava sentindo fisicamente enquanto eu fazia ele. Por
isso que se chama algia. Eu ainda não sabia lidar com a quantidade de remédios,
e fazer o meu timbre ficar... eu perdi o controle da minha voz, porque na época
eu estava tentando me acostumar ainda a falar e ter reflexos de novo, são
muitos remédios...
E o single Eu vou fugir pro Rio de Janeiro, como dá
para definir, os beats ...
Beats são bases
musicais onde tem tudo. Tem bateria, órgão, tudo o que você quiser pode ter num
beat. Originalmente era só batida, mas os beats foram evoluindo tanto que as
batidas foram ficando sofisticadas, os softwares foram ficando sofisticados, e
hoje você consegue fazer uma música inteira a partir de um beat. Então, mesmo
que tenha hip hop, rap, ali naquelas batidas, é um beat não feito para isso...
porque eu misturo com elementos bem pops. Eu tava numa fase de ouvir muito rap
nacional e muito pop nacional e internacional. Então misturou tudo. Por isso
esse trabalho tem mais lucidez. No Algia eu tava muito dopada, e eu não tinha o
controle das coisas, tudo foi feito meio que às xongas, assim (risos). Só que
agora eu sei o que eu quero, eu sento do lado do Yraq, que é meu produtor, e
falo o que eu penso. Somos co-compositores.
Quais foram suas
influencias para esse trabalho que sucedeu o Algia?
De rap tem Menestral,
Froid, Rincón Sapiencia, Criolo, Djonga.... é uma galera underground, que faz
seu sucesso. Mas eu vou na vanguarda do pop também. Porque o que me cativa no
pop é a produção. Quando entra o clap, em que parte faz a transição para o
kick, como se trabalha os graves, médios
e agudos...Na verdade eu até desconstruo o pop, mas eu ouço um pop de
bastante qualidade, como a Sia, Pharrell Williams, Drake, The Weekend, Beyoncé,
esse tipo de pop. Então fazem parte de uma pesquisa que pode até não ter método
algum, porque se trata de ouvir o que eu quero, e que naturalmente vira um
híbrido. Ah, e o Tim Bernardes, que faz uma espécie de MPB de vanguarda, e Mac
Demarco, que faz um som bem easy...tem o Devendra também, que é o gênio da
mistureba.
Eu
vou fugir pro Rio de Janeiro nasceu dessa mistura?
Sim, a música fala
dessa cantora que quer fugir pro Rio, e prospecta seus sonhos e entoa um
mantra, tipo vai dar certo! Totalmente autobiográfico, na primeira pessoa, sou
eu mesmo. E desde que eu comecei a assistir Branca de Neve com a minha filha, a
Maria Clara, eu me apaixonei por uma melodia do filme, da versão em português,
que diz um dia, um dia eu serei feliz...
mas a letra é super passiva, de uma mulher que fica esperando um homem, que
depois beija ela, salva ela...Então eu uso só a primeira frase original, mas
depois coloco minha letra como uma resposta para ela. Fiz uma releitura, uma
versão em recorte, misturado com todo o resto... No começo eu queria colocar o
início da música da Branca de Neve, e em paralelo eu tinha o refrão do vou fugir....aí o Yraq me mostrou um
beat que já era próximo de como ficou o original. Comecei com Branca de Neve, mas toda vez
que ia cantar eu saía do tom, aí eu resolvi fazer um teste, que era encaixar
o refrão e ficou perfeito, no sentido de dois pedaços darem muito certo. Aí foi
a produção do beat, onde o mérito é todo do Yraq.
O clipe também foi um
ponto alto do trabalho.
O clipe é o seguinte, eu
sempre tive vontade de trabalhar com o Felipe Vernizzi, que é um diretor e
fotógrafo, pelo qual eu sou completamente apaixonada pela linguagem
cinematográfica dele. E eu contactei ele, e mesmo com pouquíssimo orçamento,
ele veio para Florianópolis. Ele já era amigo de outro produtor com o qual eu
tenho um duo, chamado Artemisia Vulgaris, que é o Rodrigo Ramos. Eu já tinha o figurino
do clipe, e aí mostrei a música para ele, que adorou. Aí ele ouviu também outra
música, que se chama Sleep Well, que
ele adorou e quis fazer clipe dessa música também, que devemos lançar nas
próximas semanas. Esse clipe foi feito no pinheiral do Rio Vermelho, dentro de
um opala, que é um carro atemporal.
No clipe de Vernizzi
não há um lugar definido, tipo olha é
Floripa! Isso é deliberado?
É qualquer lugar. Mas
não é que não seja Floripa. Na verdade eu estou sentindo falta de uma cena em
Floripa. Tá acontecendo uma cena muito forte de mulheres, e é por isso que eu
estou sentindo falta da cena, porque existem as pessoas mas não existe espaço
de sobrevivência através da música. Pessoas incríveis, como a Renata Swoboda, a
Carol Voigt, uma mulherada.. os Skrotes são maravilhosos...aqui teve uma música
praiana, de reggae, que eu acho que se foi, ficou um vácuo. Falta subsídio,
galera tá dura de grana, nem para ir a show. O clássico agora é comprar cerveja
no mercado para beber em casa. E há um boicote a cultura que foge do padrão
“ilhéu”, infelizmente. Tem François Muleka, tem um monte gente, que eu acho que
já tem seu prestígio. O que tá faltando é um espaço de renovação. É muito
difícil a abertura da mídia daqui para coisas novas, pessoal prefere repetir a
pauta com o mesmo artista do que dar um play e ouvir de verdade o que o artista novo enviou junto
com o release.
por Marlon Aseff
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