segunda-feira, 9 de dezembro de 2013
Juscelino foi assassinado !
A Comissão Municipal da Verdade Vladimir Herzog, da cidade de São Paulo, vai divulgar nesta terça-feira, 10 de dezembro de 2013, um documento com evidências de que o ex-presidente brasileiro Juscelino Kubitschek (1956-1961) foi assassinado durante viagem de carro na rodovia Presidente Dutra, e não morto em um acidente, como registra a história oficial.
O relatório reúne 90 indícios, "evidências, provas, testemunhos, circunstâncias, contradições, controvérsias e questionamentos" que concluem que o ex-presidente foi alvo de um complô em 22 de agosto de 1976. Segundo a versão oficial, JK, que tentava articular a volta da democracia ao País, morreu em um acidente com um Opala na estrada.
"Não temos dúvida de que Juscelino Kubitschek foi vítima de conspiração, complô e atentado político", afirma o vereador Gilberto Natalini, presidente da Comissão Municipal da Verdade.
As circunstâncias da morte do presidente são investigadas pelo órgão municipal, que busca ajudar a Comissão Nacional da Verdade para esclarecer o caso. Em agosto, Serafim Melo Jardim, secretário particular do ex-presidente nos seus últimos nove anos de vida, afirmou à comissão ter certeza de que JK vinha sendo vigiado. "Eu acompanhei o presidente desde que voltou do exílio. Sempre que viajávamos ele dizia: 'Estão querendo me matar'."
Outro ponto levantado pela comissão na época foi a falta de radiografia no corpo do motorista Geraldo Ribeiro, apesar do fragmento metálico de sete milímetros em seu crânio, que seria um grave indício de arma de fogo. As fotos dos corpos teriam sido retiradas do processo a mando de Francisco Gil Castello Branco, ex-diretor do Departamento Técnico-Científico da Secretaria de Segurança Pública do Rio de Janeiro à época.
O esforço de JK para o retorno democrático no Brasil nos anos 1970 era motivo de preocupação para os agentes da Operação Condor, aliança político-militar entre as ditaduras do Brasil, Argentina, Chile, Bolívia, Paraguai e Uruguai.
Em uma carta enviada no dia 28 de agosto de 1975 para o presidente João Baptista Figueiredo, o chefe do serviço de inteligência de Augusto Pinochet, coronel Manuel Contreras Sepulveda, se diz preocupado com a possível vitória de Jimmy Carter nos EUA e o apoio a políticos de oposição à ditadura na região, como o chileno Orlando Letelier e o próprio JK. Segundo ele, os líderes "poderiam influenciar seriamente a estabilidade do Cone Sul". No ano seguinte ao envio da correspondência, JK morria em agosto, e Letelier, em setembro.
publicado originalmente em Carta Capital
sábado, 27 de julho de 2013
Vinte Anos sem Valda
sexta-feira, 31 de maio de 2013
Pela preservação dos lugares da memória fronteiriça.
O esplendor da
Praça General Flores da Cunha poderia exemplificar o glamour dos espaços de lazer
do Santana do Livramento nas primeiras décadas do século vinte. Revendo meus
arquivos para entender melhor o “desfalecimento” do lugar, deparei-me com o
vigor das lembranças de dois grandes personagens da cidade: o barbeiro centenário
Humberto Bisso e seu octagenário colega Floriano Menendes. Túnel do tempo acionado
em umas fitas K-7 (gravadas em 2001) e em imagens flashback que envolve minha mente ressurgem suas vozes fracas,
melancólicas, em suas reminiscências: os templos da noite, a diversão no
Areial, daquela Santana escura, que “tinha apenas duas ruas, mui diferente e
divertida”. Seu Bisso recorda os companheiros que tinham de atravessar a linha,
para tocar serenatas para as famílias riverenses, os comerciantes e também para
o Chefe da polícia Ventura Pires, quando em Santana imperava a repressão nos
anos das revoltas de 1923 e 1924 . Sua orquestra era vanguarda, binacional, composta
por barbeiros, alfaiates, guarda livros, estafetas e talabarteiros. Alguém
ainda lembra desses ofícios? Alguém lembra o quanto era formosa a Praça Flores
da Cunha, ou Pracinha dos Cachorros?
Quem recorda
dos bancos de granito rosa, do moderno e vibrante calçamento petit pavê, dos lambe-lambes presentes em nossa infância no Parque Internacional? Sabemos
que a construção da memória passa pela ação das forças sociais em constante
luta pelo controle e exercício de poder, mas especialmente pela determinação do
que se quer passar a posteridade. Creio que o momento é pertinente para
tratarmos da ação da memória, quando na fronteira andamos em uma época de
infertilidade no trato do patrimônio cultural. Porque temos que pensar em
memória? Em que medida as memórias dessas experiências vividas, de sua
construção como cidadãos, como profissionais, podem contribuir para que a
comunidade passe a conhecer e respeitar seu patrimônio histórico? Pois bem,
sabemos que só respeitamos o que conhecemos! Será que conhecemos a riqueza da
história cultural de nossa cidade ou da fronteira? Ao longo de nossa existência
tentamos rememorar e recontar a memória e os lugares do encontro fronteiriço
aos nossos filhos, amigos e netos, como nossos avós, e pais o fizeram? Temos
uma grande responsabilidade na preservação da memória social, precisamos nos
responsabilizar e seguir o caminho do coração, sob pena de perdermos nossas
referências culturais, e o pior, não termos herança a passar aos nossos
descendentes. Essa advertência foi constante em minhas conversas com Bisso,
Floriano, Elda Cortez e Sinhá Borba, entre outros memorialistas da cidade, que
hoje não estão entre nós. “Quem irá contar que fomos grandes, que Santana teve
vigor?” indagou certa vez, um deles. Calei, ouvindo muito do que eles tinham a
relatar, porque naquele momento não saberia contrapor essa questão. Tentei dar
uma luz ao que os memorialistas contaram, escrevendo minha pesquisa que abordava
a memória oral e os lugares de lazer na fronteira. Não sei se consegui
responder a eles, porém consegui registrar suas memórias para as novas gerações.
Vejo que existe
uma ruptura na passagem dessa memória, seja oral ou mesmo documental, em nossa fronteira. Prova disso é
o distanciamento que nossa sociedade demonstra de temas tão atuais como a
preservação do que restou do nosso patrimônio histórico, hoje ameaçado pela
especulação imobiliária e falta de conservação. Se costumávamos escutar as
histórias de nossos antepassados, será que contamos alguma história para esta
nova geração? Por isso li com prazer o que o escritor Luciano Machado escreveu
a um colunista deste jornal sobre a importância da Praça Flores da Cunha na
memória da fronteira. Temos que ter o encantamento de rememorar, mas também
ações para preservar os espaços da memória.
Pensar a
preservação da memória de nosso patrimônio histórico e afetivo, em um tempo em
que tudo deve ser novo, moderno, hiper-moderno, pós-moderno é um desafio que a
comunidade e o poder público devem tomar para si. Se os fenômenos da globalização nos conectam
com o mundo todo, também nos impulsionam em direção contrária, negando muitas
vezes essa representação do passado e sua força revitalizadora. Se pensarmos
que a palavra patrimônio tem origem latina, derivada de pater, que significa pai, encontraremos o sentido de herança,
legado, isto é, aquilo que o pai deixa para os filhos. Assim, patrimônio é o
conjunto de bens produzidos por outras gerações, ou seja, os bens resultantes
da experiência coletiva, que estão vivos e recentes em nosso cotidiano. E para
preservá-lo precisamos de ações coletivas e individuais, pragmáticas, que contemplem
também “exercícios” da memória, entre nossos familiares, vizinhos, amigos e comunidade.
O filósofo alemão
Walter Benjamin, ao trabalhar com a memória como rememoração, destacou a
importância da narrativa e do distanciamento como premissa para se entender a essência da função do
narrador, em crise já nos anos 30. Cada momento, ensina, é
importante para algum sujeito, portanto, nada é insignificante ou perdido para
a história. Sendo assim, será que observamos
o som ao redor? Quem são nossos narradores? Temos milhares, basta buscá-los e,
acima de tudo, registrá-los, mapeá-los e respeitá-los. Suas lembranças são
nossa maior herança, em uma sociedade que a cada dia perde um significado, desfigurando-se,
com a velocidade da informação. Como afirmou o poeta libanês Khalil Gibran, “as
distâncias não existem para a recordação; e somente o esquecimento é um abismo
que nem a voz nem o olho podem atravessar.”
texto: Liane Chipollino Aseff
fotos: Marlon Aseff, Lucianne Hamilton.
quarta-feira, 10 de abril de 2013
Pelo fim do exilio
Há um
sentimento que me liga a Livramento: um sentimento de exílio. Amo essa cidade,
o cheiro desses campos me faz bem, a água é boa, nada como tomar chimarrão
embaixo de um cinamomo em qualquer lugar daí. Essa linha de fronteira é mágica,
há misturas de sotaques e costumes. Foi nessa linha que Aparicio Saravia caiu
em combate e embaixo de um guapuruvu centenário que fica na praça em frente à
prefeitura Hernandez concluiu o Martin Fierro. Há uma cidade com memória, com
história, com passado, mas parece que quase só isso sobrevive hoje: memória e
passado. A cidade do já teve, exilada para sempre de uma glória perdida.
Pouca coisa
vinga em Livramento, tirando um comércio sobrevivente e o melancólico papel de
ser apenas corredor de passagem ou dormitório para a onda consumista que leva
gente aos free-shops. O maior empregador do município é a prefeitura, o que já é por si só uma
distorção: poder público é para atender o cidadão, não um cabide de empregos. O
jogo político da cidade, assim, vira um toma lá da cá de baixo clero, onde em
geral gabinete de vereador vira uma central de favores a seus eleitores e
apaniguados. Enfim, a cidade navega na tábua rasa da política de resultados
paroquiais. A pequena política que apequena a cidade.
Faço essas
observações de longe porque sou um santanense exilado, como tantos da minha
geração. A falta de perspectiva dessa
cidade expulsa pessoas para tentar a vida em outros lugares. É grande a
diáspora de santanenses por esse Rio Grande e Brasil afora. Jamais conheci
algum que não declare um grande amor pela cidade, sob o amargo sabor de, de
certa forma, ter sido rejeitado por ela. Porque, parece, Livramento não espera
construir-se pela igualdade de oportunidades, pelo esforço coletivo, pela força
de novas idéias criativas. Livramento espera um salvador e um favor de quem
quer que seja para patrocinar a cidade como um mecenas. Talvez isso explique a
dificuldade de processos de construção coletiva. Em Livramento, as pessoas não
olham para o lado. Olham pra baixo.
Na
mentalidade do já teve, há uma quixotesca nostalgia de um frigorífico e um
lanifício que eram os grandes pais da cidade. Até hoje ouço pessoas medirem se
governos estaduais são bons ou ruins na medida em que “trazem alguma coisa pra
Livramento”. Ou seja, a cidade espera presente de um pai sempre – seja uma
empresa, seja um governo. Falta entender que a gente só amadurece quando anda
com as próprias pernas, quando se emancipa do pai, quando constrói a própria
história.
Um novo
ciclo histórico se inicia agora na prefeitura de Livramento. Como identidade
principal dessa nova administração, a insígnia de ser um governo municipal alinhado
com um Governo Federal que mudou a cara do Brasil: o país que olhava pra baixo
agora olha pra frente. Esse desvio do olhar, essa mudança de mentalidade, esse
resgate da auto-estima, talvez sejam o ponto inicial para Livramento mudar. E
se o sentimento de exílio, para muitos que se foram daí, é uma marca pessoal,
penso que ele se estende também coletivamente para uma cidade que parece
exilada de si mesma. Ou seja, da possibilidade de construir o presente, da indiferença do que pode melhorar no futuro.
Semana
passada, na sua coluna no jornal uruguaio Brecha, Eric Nepomuceno analisou os
dez anos dos governos do PT no Brasil. E
entre acertos e contradições, concluiu que numa coisa esses governos avançaram:
deram à maioria da população o direito de ser cidadão em seu próprio país.
Transportando para o campo pessoal, posso dizer que me sinto um cidadão neste
país, mas isso seria difícil de acontecer se vivesse na minha cidade.
Porque
queria estar em algum projeto construindo coisas ao lado de outras pessoas.
Porque não há mágica ou salvador da pátria ou da cidade. Dois verbos movem a
vida: trabalha e confia. Difícil trabalhar onde não há perspectiva, difícil
confiar quando o interesse público é um favor que se troca na esquina ou no
armazém. Livramento precisa pensar grande. No campo da política, saltar da
lógica dos favores e acertos para a elaboração de projetos e renovação da
matriz produtiva, aproveitando os recursos disponíveis a nível federal. Há um
governo que pede projetos. Há um país que pede campo para crescer. É isso que
pode incluir a cidade num outro caminho, abrindo cancha para uma mentalidade generosa.
E enfim Livramento se reconcilie consigo mesma. Uma cidade acolhedora, sem
exílios, sem exilados. Uma cidade altiva, olhos à frente, em paz com uma bela
história que ainda pode construir.
Renato Dalto
Jornalista, escritor, roteirista de TV e
cinema
terça-feira, 26 de março de 2013
Personagens do mundo árabe fronteiriço
Em 1910, Elias Saad Saquer, aos 14 anos,
empreendeu viagem solitária rumo a América do Sul. Com outros companheiros
libaneses, chegou ao Uruguai. Muitos outros jovens seguiram este
roteiro para outros países como Brasil, Argentina, Chile, México, tentando
escapar do alistamento militar obrigatório. Chegando
ao porto de Montevideo foi acolhido por uma
familia de pioneiros. Sem dinheiro e não sabendo para onde ir, os
amigos indicaram a cidade de Tranqueras. Ali Elias conheceu alguns conterranêos
da sua aldeia, trabalhou, constituiu familia e integrou-se a cultura
uruguaia. Faleceu em
1963. (Acervo José Maria Almada Sad )
Fouad Azario Chein, naturalizado brasileiro, Fouad Azario dos Santos, emigrou para o Brasil quando ainda era bebê, com seus pais e o irmão Inácio. Nos anos cinquenta os irmãos inauguraram a Casa Chein, célebre na memória fronteiriça pelo histórico slogan: Vamos a Casa Chein? onde um cruzeiro vale cem!
Seu Fouad, com 99 anos ainda atende diariamente seu comércio com uma simpatia ímpar que a comunidade admira há mais de setenta anos.
Familia de imigrantes libaneses: Khalil Aseff e Rosa Felis, em reunião dominical no quintal de seus compadres, Salomón Bouchacourt e Saide Najas Keirus, em Rivera, meados dos anos trinta. Os amigos provenientes de Bcharre chegaram ao Uruguai em 1901.
Carteira de estrangeiro de Khalil Aseff, dos anos 40.
O escritor e poeta uruguaio-libanês, Antonio Dib Seluja Cecín, autor de Los Libaneses en el Uruguay, fotografado em julho de 2011.
Grupos de amigos libaneses e palestinos em reunião descontraída nas manhãs dominicais no Parque Internacional, meados dos anos 50. (Acervo Sami Kazakka)
Fouad El Ters chegou ao Uruguai em 1956, onde fundou a Casa Oriental, na Calle Agraciada, em Rivera.
É assiduo frequentador do "Clube" do amigo Ibrahim Tarabay, localizado do outro lado da linha divisória brasileira, na Avenida João Pessoa. No meio da tarde a Casa Líbano, recebe a visita de amigos palestinos e libaneses, que reunidos conversam em árabe.
Mohamad El Haninni, poeta e escritor palestino, reside em Santana do Livramento desde os anos oitenta.
Autor de obra extensa, tem livros publicados na Palestina e Brasil, membro da Academia Santanense de Letras e da Sociedade Árabe Palestina. (Acervo A Platéia)
Luiz Normey Cecín, professor e comerciante, filho de Elias e Luisa Normey, em sua casa em Rivera.
Ibrahim Tarabay, em sua loja, o Varejo Líbano, em Santana do Livramento, 2008. Ibrahim reside em Rivera desde sua chegada ao Uruguai, em 1951, porém sempre possuiu comércio do lado brasileiro da fronteira.
Monir Suleiman, médico e presidente da Sociedade Árabe Palestina de Santana do Livramento, 2008.
Rage Maluf, comerciante libanês e ativista cultural entre a comunidade árabe nas décadas de 40 e 60. Em sua loja recebia os amigos para uma descontraida reunião árabe. (Acervo Família Maluf)
Miguel Salim Gabriel, oriundo de Zaida, chegou ao Brasil em 1902. Foi mascate pela campanha fronteiriça e em seguida radicou-se em santana do Livramento, fundando em 1912 a tradicional Casa Salim. (Acervo Familia Salim)
Isabel Najas, uma uruguaia arabizada, casou-se com o libanês Mussi Najas entrando para o mundo árabe. Aprendeu a lingua, a cuilinária e os costumes da terra de seu marido. Com seus vigorosos 95 anos, é admirada pela comunidade libanesa de Rivera, militante e amante da política, desde adolescente milita nos quadros do Partido Nacional, (Blanco). Seus maiores idolos : Aparicio Saravia e San Charbel.
Nedi Normey
Secím. Pianista e cantora lírica, nos anos trinta gravou como solista de ópera
no Teatro Sodre, em Montevideo. Incansável, a mestre nonagenéria ensinou piano
da sala de estar de sua residência, na Calle Brasil, em Rivera. Desde
pequena Nedi encantava as plateias com sua voz singular, seja nos saraus
particulares, na missa ou nas reuniões da Sociedade Libanesa, onde costumava
cantar. Foto de 2010.
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