A fronteira se caracterizou desde o início da colonização por ser local de refúgio e abrigo político aos que lutavam contra o poder centralizador do Estado-Nação, que cresceria com o passar das décadas, até acabar por estrangular as tentativas caudilhescas de autonomia, como no caso dos federalistas brasileiros e blancos, uruguaios . Habitada por famílias brasileiras nos primeiros anos, uma extensa faixa uruguaia da fronteira via-se sucessivamente conflagrada por interesses contrários ora ao poder central uruguaio, ora aos ditames do Império e, mais tarde, da república brasileira. A cidadania pouco importava quando se tratava de importar homens de um lado ou outro da fronteira, e impor novos moldes sociais, conferindo assim um aspecto original dessa cultura política urdida naquela região. Em 1869, incidentes envolvendo forças políticas uruguaias, conspirando a partir de Santana do Livramento, provocaram um atrito entre o governo uruguaio e o Império, conforme assinala o historiador Anibal Barrios Pintos, em sua obra "Rivera en el ayer". O incêndio do quartel da polícia da vila de Rivera, que resultou em tiroteio e desordens, gerou a manifestação do comissário da 4a Secção de Polícia, que relatou ao seu superior, em Taquarembó, o que considerou "el echo mas barbaro por la Nación Brasilera". Na carta endereçada ao chefe de polícia, Vital Zapata, informava que, (...) la fuersa de los infames hera mayor y e sido bencido completamente derrotado con pérdida de algunos hombres que ignoro los que abran muerto como a sido de noche yo e salbado com cuatro prebiniéndole que me an incediado la guardia y salido bajo del incendio com el caballo baliado y como debo quedar reuniendo algunos hombres para sostener mi deber asta que V.E. tome sus energicas medidas en amor de la Nación de tan terrible atentado (...) O que poderia parecer um gesto de desagravo e disputa de fronteiras por parte dos brasileiros, no entanto, foi habilmente considerado pelo Império como uma situação de conflito unicamente entre forças políticas uruguaias, que se valeram da situação de fronteira para usar a cidade brasileira como um despiste. Conforme apurou o historiador santanense Ivo Caggiani, a alegação do governo uruguaio, de que um grupo de homens armados teria queimado o quartel da polícia, em abril de 1869 e mesmo assaltado Rivera em março de 1870, não foram aceitas pelo chefe da polícia riograndense, que esteve na fronteira, enviado pelo presidente da Província, para averiguar os fatos.
Texto retirado da dissertação de mestrado Retratos do exílio: experiências, solidariedade e militância política de esquerda na fronteira Livramento - Rivera (1964-1974), defendida em dezembro de 2008, no Departamento de História da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), sob orientação do prof.DR Paulo Pinheiro Machado. Posteriormente incluído no livro Retratos do Exílio, solidariedade e resistência na fronteira (Edunisc, 2009). Mapa da linha de fronteira, retirado do site do Ministério das Relações Exteriores.
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